https://sites.google.com/site/fhilos11/resumos/argumentacao-e-logica-formal/argumentacao-e-logica-formal
1.Argumentação e Lógica Formal
Muito antes da lógica ter sido organizada como ciência, já o homem fazia uso do pensamento. Para compreender e se compreenderem, os homens precisam de usar o pensamento e de se exprimir, falando. Para agirem sobre o espírito dos seus semelhantes ou para se influenciarem reciprocamente, os homens têm necessidade de pensar, discutir, persuadir, raciocinar. A lógica nasce naturalmente com a necessidade de satisfazer o mínimo de coerência mental que a persuasão exige, mas começa a organizar-se como ciência, quando o homem ultrapassa o nível imediato do pensar para agir e procura, numa atitude reflexiva, os fundamentos implicados no exercício do pensamento. Antes do advento de uma lógica científica existe uma lógica natural. A lógica formal começou a ser sistematizada, no ocidente, pela primeira vez no século IV a.C., por Aristóteles, e limita-se apenas ao estudo da validade dedutiva. A lógica aristotélica foi o modelo de referência lógico até ao século XVI. Durante os séculos XVI e XVII, Leibniz deu início à construção da lógica simbólica moderna, mas foram os matemáticos Frege e Boole que criaram a lógica moderna, ao substituir a linguagem natural por símbolos análogos ao matemáticos, definindo, igualmente, as regras formais da sua utilização. Os lógicos contemporâneos transformaram a lógica numa disciplina praticamente autónoma em relação à filosofia e desenvolveram processos formais de avaliação de argumentos.
O estudo da lógica pode desenvolver a capacidade de discernimento de cada um, através do fornecimento de instrumentos que permitem identificar raciocínios válidos/correctos e não válidos/incorrectos (inválidos), de instrumentos para analisar diversos discursos argumentativos (político, filosófico, científico) ou através do disciplinar do pensamento. O estudo da lógica pode levar mais longe o raciocínio, ajudar a identificar mais facilmente a má fé (manipulação) nos argumentos alheios e a distinguir o uso legítimo ou ilegítimo que se faz do pensamento e que se manifesta no discurso.
Lógica = estudo das condições de coerência do pensamento e do discurso. O mesmo é dizer, o estudo dos argumentos (raciocínios ou inferências) válidos.
Pensar = operar com conceitos (formar juízos ou raciocínios)
Discursar = exprimir verbalmente o pensamento
Pensamento = resultado (produto) do operar com os instrumentos lógicos [ligar ou relacionar diferentes conceitos entre si, construir juízos ou raciocínios (ao nível da mente)].
Discurso = materialização (verbalização) do pensamento.
Condições de coerência = regras/princípios que tornam válidos os pensamentos – princípios lógicos – regras das inferências válidas.
Princípios lógicos
Os princípios lógicos são princípios formais que regulam o pensamento independentemente dos conteúdos do mesmo, obrigando-o a ser coerente e consequente consigo próprio. São três as leis do pensamento:
i. O princípio da identidade - qualquer proposição implica-se a si própria ou uma coisa é igual a si mesma.
P = P
ii. O princípio da não-contradição - nenhuma proposição é, ao mesmo tempo, verdadeira e falsa ou uma coisa não pode, ao mesmo tempo, ser e não ser.
______
P e P
iii. O princípio do terceiro excluído - toda a proposição é verdadeira ou falsa ou uma coisa é ou não é (não há terceira possibilidade).
P ou P
Instrumentos lógicos
Distinção entre verdade e validade
Verdade – designa o valor lógico do juízo/proposição e indica a adequação entre o enunciado (juízo/proposição) e a realidade enunciada pelo juízo/proposição.
Validade – designa o valor lógico do raciocínio e indica a coerência interna do pensamento, isto é, o respeito pelas regras lógicas.
· Verdade > Adequação > Correspondência > Juízo/Proposição > (verdadeiro/a ou falso/a)
· Validade > Coerência > Respeito pelas regras > Raciocínio/Argumento > (válido ou não válido)
A verdade e a falsidade ocorrem apenas ao nível das proposições ou dos juízos. A falsidade e a verdade julgam a matéria ou o conteúdo das proposições ou dos juízos. Aquilo que se afirma ou nega será verdadeiro ou falso se estiver ou não de acordo com a realidade, se traduzir a adequação ou a inadequação entre o enunciado e a realidade enunciada.
A validade e a invalidade são atributos do argumento ou do raciocínio e referem-se à forma que estes podem adoptar, isto é, à estrutura que pode assumir a relação entre as diversas proposições ou juízos que compõem o argumento ou o raciocínio, independentemente do conteúdo (do que afirmam ou negam).
A validade de uma inferência é independente do valor lógico das proposições ou dos juízos que a compõem, ela é a garantia de que o que se conclui deriva necessariamente do que se pressupõe. Assim, é possível obter uma inferência válida constituída por proposições falsas e uma inferência não válida constituída por proposições verdadeiras, mas não é possível encontrar uma inferência dedutiva válida com uma proposição conclusão falsa que derive de proposições premissas verdadeiras.
A uma inferência válida e que é constituída por proposições verdadeiras (se é que é possível estabelecer essa verdade – cepticismo) dá-se, habitualmente, o nome de sólida, forte ou segura.
Tipos de raciocínio
Um raciocínio também pode ser chamado de inferência.
Uma inferência é uma transição ou uma passagem de uma proposição a outra.
As inferências (raciocínios) podem ser:
· Dedutivas - quando se parte de uma ou mais proposições tomadas como antecedente (premissas) e delas se retira uma outra proposição (conclusão), por estar nela contida, segundo as regras das inferências dedutivas válidas. A dedução é a operação intelectual dedutiva. As inferências dedutivas podem ser imediatas (oposição e conversão), se a operação lógica se realizar apenas pelo jogo de dois termos e mediatas, se a operação ligar entre si dois conceitos (termos) por intermédio de um terceiro (silogismo).
· Não Dedutivas - quando as proposições premissas apoiam com maior ou menor força, mas não garantem a verdade da proposição conclusão. São operações mentais (cognitivas) não dedutivas a indução (operação mental em que a partir de proposições particulares tomadas como antecedentes se retira uma proposição geral que é o consequente), a analogia (operação mental em que a partir de características conhecidas numa classe de objectos se infere que objectos considerados similares, ainda que diferentes, possam ter as mesmas propriedades) e a abdução (operação mental criativa(palpite) em que a partir de factos problema ou da observação de fenómenos se criam hipóteses - respostas prévias, mas razoavelmente sustentadas - para os problemas equacionados).
No quadro seguinte, apresentamos uma distinção entre o raciocínio dedutivo e indutivo.
O conceito e o termo
O conceito é uma representação mental, geral e abstracta que designa, na mente, um conjunto de propriedades que pertencem a um conjunto de seres ou de objectos.
O termo é a expressão verbal do conceito.
O conceito e o termo apresentam, como decorre da definição, duas dimensões:
à um conjunto de propriedades = a compreensão ou intensão
à um conjunto de objectos = a extensão ou denotação
No conceito cão:
à o conjunto de propriedades = animal doméstico que ladra = a compreensão ou intensão
à o conjunto de objectos = os animais que possuem esses atributos = a extensão ou denotação
Relação entre a extensão e a compreensão
A extensão e a compreensão de um conceito variam em sentido inverso, isto é, numa série de conceitos entre si relacionados, o conceito de maior extensão é precisamente o de menor compreensão e vice-versa.
A extensão e a compreensão de um conceito determinam-se reciprocamente, isto é, dada a compreensão de um conceito determina-se a extensão e vice-versa.
Com base na relação entre a extensão e a compreensão é possível organizar conceitos, entre si relacionados, de modo que um caiba na extensão do outro, em séries crescente e decrescente de extensão e compreensão.
Exemplo:
O juízo e a proposição
O juízo é uma operação mental mediante a qual se ligam entre si conceitos e que pode ser considerada verdadeira ou falsa.
A proposição é a expressão verbal do juízo.O juízo e a proposição assumem apenas dois valores lógicos ou valores de verdade: verdadeiro(a) ou falso(a).
Apenas os enunciados apofânticos (frases declarativas) é que se enquadram na categoria das proposições, porque atribuem a um sujeito alguma coisa e, neste sentido, são susceptíveis de serem considerados verdadeiros ou falsos. Todas as outras frases, imperativas, interrogativas e exclamativas, porque não podem ser consideradas verdadeiras ou falsas não podem ser transpostas para a forma canónica, ou forma padrão, das proposições. Uma frase declarativa é um enunciado linguístico em que se diz algo acerca da realidade e uma proposição é o pensamento que nela está expresso. A proposição e a frase estão relacionadas, mas são realidades diferentes. A proposição é uma entidade lógica e a frase declarativa uma entidade linguística. Assim, uma mesma proposição pode ser expressa por frases declarativas diferentes e uma frase declarativa (que seja ambígua) pode expressar proposições diferentes.
As proposições, quanto ao tipo de ligação que se estabelece entre os termos, podem ser:
· Categóricas: quando a proposição estabelece uma relação que não apresenta qualquer restrição.
Forma Padrão: S é P (O quadro é preto)
· Hipotéticas (Condicionais): quando a proposição estabelece uma relação que apresenta restrições ou condições (reservas).
Forma Padrão: Se … então … (Se não estudar, então não passo de ano)
· Disjuntivas: quando a conexão estabelecida apresenta alternativas.
Forma padrão: ou… ou … (Ou estudas ou chumbas)
Elementos das proposições categóricas:
As proposições categóricas são constituídas por quatro elementos.
· Sujeito (rosas) – o ser ou conjunto de seres aos quais é atribuída uma propriedade.
· Predicado (vermelhas) – o atributo ou a propriedade que é atribuída ao sujeito.
· Cópula (são) – o elemento que estabelece a ligação entre o sujeito e o predicado.
· Quantificador (algumas) – o elemento que indica a extensão do sujeito.
Classificação das proposições categóricas:
A lógica tradicional aristotélica classificou as proposições em quatro tipos, simbolizadas pelas vogais maiúsculas A, E, I e O, segundo a quantidade e qualidade.
- Quantidade – a quantidade de uma proposição depende da extensão do sujeito, é indicada pelo quantificador (todo, algum, nenhum).
• A proposição é UNIVERSAL, quando o sujeito é tomado em toda a sua extensão. Quando o sujeito é só constituído por um elemento (singular), está sempre tomado em toda a sua extensão, a proposição é UNIVERSAL.
• A proposição é PARTICULAR, quando o sujeito é tomado em parte da sua extensão.
- Qualidade – a qualidade de uma proposição é determinada pela natureza da cópula (é ou não é) e indica uma relação de inclusão ou de exclusão da extensão do sujeito (na/da) do predicado.
• A proposição é AFIRMATIVA, quando se estabelece uma relação de inclusão da extensão do sujeito na do predicado.
• A proposição é NEGATIVA, quando a relação indica a exclusão da extensão do sujeito da extensão do predicado.
Assim:
A – universal afirmativa – todo S é P – Todas as rosas são vermelhas
E – universal negativa – nenhum S é P – Nenhuma rosa é vermelha
I – particular afirmativa – algum S é P – Algumas rosas são vermelhas
O – particular negativa – algum S não é P – Algumas rosas não são vermelhas
Quantificação dos termos que constituem as proposições:
• A extensão do sujeito é indicada pelo quantificador (todo, algum, nenhum). Quando o quantificador for todo ou nenhum, o sujeito está tomado em toda a sua extensão, está distribuído (D). Quando o quantificador for algum, o sujeito está tomado em parte da sua extensão, está não distribuído (ND).
• O predicado das proposições afirmativas (A e I) está sempre tomada em parte da sua extensão, está não distribuído (ND).
• O predicado das proposições negativas (E e O) está sempre tomado em toda a sua extensão, está distribuído (D).
O Silogismo
Um silogismo é um argumento dedutivo formado, normalmente, por três proposições, em que duas delas funcionam como premissas ou antecedente e a outra como conclusão ou consequente.
Um silogismo pode ser:
• Categórico – formado por proposições categóricas.
Antecedente <=== Todo o A é B ===> Premissa
Antecedente <=== Todo o B é C ===> Premissa
Consequente <=== Todo o A é C ===> Conclusão
• Hipotético – formado por pelo menos uma proposição hipotética.
Antecedente <=== Se A, então B. ===> Premissa
Antecedente <=== Ora, A. ===> Premissa
Consequente <=== Logo, B. ===> Conclusão
• Disjuntivo – formado por pelo menos uma proposição disjuntiva.
Antecedente <=== Ou A ou B. ===> Premissa
Antecedente <=== Ora, A. ===> Premissa
Consequente <=== Logo, não B. ===> Conclusão
No discurso, os argumentos dedutivos normalmente não seguem a forma padrão ou canónica (silogismo): enunciar em primeiro lugar as premissas e depois a conclusão. Quando a finalidade é convencer o auditório, o emissor pode preferir apresentar a conclusão antes das premissas, depois das premissas, entre as premissas, intercalar considerações que podem dificultar a identificação das premissas e da conclusão, omitir uma premissa ou até mesmo a conclusão, se entender que isso potencia o poder de persuasão do argumento. Para identificar, no discurso, as premissas e a conclusão é necessário atender aos conectores do discurso (palavras que ligam frases), a que nós, por comodidade, podemos chamar indicadores de premissas e indicadores de conclusão.
O silogismo categórico
Um silogismo categórico é um raciocínio dedutivo formado por três proposições categóricas e por três termos, em que dois deles (o menor e o maior) são ligados entre si pelo terceiro (o médio).
• Um silogismo categórico é constituído por três proposições (premissa maior, premissa menor e conclusão).
• Um silogismo categórico é constituído por três termos (médio, maior e menor).
• Termo médio – está presente nas premissas, estabelece a ligação entre o termo maior e o termo menor e não entra na conclusão.
• Termo maior – é sempre predicado na conclusão e é o termo de maior extensão.
• Termo menor – é sempre sujeito na conclusão e é o termo de menor extensão.
• A premissa maior é a que contém o termo maior.
• A premissa menor é a que contém o termo menor.
As figuras do silogismo categórico
A figura de um silogismo categórico determina-se pelo lugar que o termo médio ocupa nas premissas. Assim:
• Quando o termo médio é sujeito na premissa maior e predicado na menor, o silogismo é da 1ª figura (I).
• Quando o termo médio é predicado nas duas premissas, o silogismo é da 2ª figura (II).
• Quando o termo médio é sujeito nas duas premissas, o silogismo é da 3ª figura (III).
• Quando o termo médio é predicado na premissa maior e sujeito na premissa menor, o silogismo é da 4ª figura (IV).
O modo do silogismo categórico
O modo do silogismo categórico determina-se pelo tipo de proposições que o constituem (A, E, I, O), segundo a seguinte ordem: premissa maior, premissa menor e conclusão. A partir do exemplo já usado,
podemos afirmar que o silogismo categórico é da primeira figura, uma vez que o termo médio (homem) é sujeito na premissa maior e predicado na menor, e o modo é AAA, porque a premissa maior é uma proposição universal afirmativa - A, assim como a premissa menor e a conclusão.
Regras do silogismo categórico
Regras dos termos:
• Um silogismo categórico é constituído apenas por três termos: o termo maior, o termo menor e o termo médio.
• O termo maior e o termo menor não podem ter maior extensão na conclusão do que nas premissas.
• O termo médio deve estar distribuído (tomado em toda a sua extensão) em pelo menos uma premissa.
• O termo médio não pode entrar na conclusão.
Regras das proposições:
• De duas proposições afirmativas não se pode retirar uma conclusão negativa, a conclusão tem de ser afirmativa.
• De duas proposições negativas nada se pode concluir.
• De duas proposições particulares nada se pode concluir.
• A conclusão segue sempre a parte mais fraca. A parte mais fraca é a quantidade particular e a qualidade negativa. Assim, a conclusão terá de ser particular e/ou negativa, se uma proposição o for.
Silogismos válidos
Falácias formais
Falácias são erros que ocorrem nos raciocínios e afectam a sua irrefutabilidade. Os erros podem ser intencionais ou não (paralogismos). Nas falácias, são sempre intencionais.
Uma falácia formal é um raciocínio dedutivo que parecendo válido não o é. É um argumento que não é cogente. Um argumento cogente é válido, tem premissas verdadeiras e estas são mais plausíveis do que a conclusão.
Falácias formais são raciocínios dedutivos que violam alguma regra do raciocínio dedutivo válido ou alguma forma válida.
Algumas falácias formais do silogismo categórico
Para a Lógica Aristotélica, e segundo as orientações para efeitos de avaliação sumativa externa das aprendizagens na disciplina de Filosofia, as principais falácias formais a tratar são: "a falácia do termo não-distribuído, a ilícita maior e a ilícita menor." Segundo as orientações complementares são: quatro termos, termo médio não distribuído, ilícita maior e ilícita menor.
• Falácia dos quatro termos (falácia do equívoco) – é um silogismo que tem mais do que três termos. Um dos termos, o termo médio, apresenta dois significados diferentes que correspondem efectivamente a dois conceitos, apesar de estarem representados pelo mesmo significante, pela mesma palavra.
Todas as margaridas são plantas
Algumas mulheres são margaridas
Logo, algumas mulheres são plantas
• Falácia do termo médio não distribuído – é um silogismo em que o termo médio não se encontra distribuído em pelo menos uma premissa.
Algumas afirmações são verdadeirasND
Algumas coisas verdadeirasND são relativas
Logo, algumas afirmações são relativas
Este silogismo viola, ainda, a regra das proposições - de duas proposições particulares nada se pode concluir - a premissa maior é uma proposição do tipo I, assim como a menor. Dedutivamente não é possível retirar qualquer conclusão.
• Falácia do transito ilícito do termo maior (ilícita maior) – é um silogismo em que o termo maior apresenta maior extensão na conclusão do que na premissa maior.
Nenhum homem é uma mulher
Algumas mulheres são alemãsND
Logo, alguns homens não são alemãesD
• Falácia do transito ilícito do termo menor (ilícita menor) – é um silogismo em que o termo menor apresenta maior extensão na conclusão do que na premissa menor.
Tudo o que gera massacres é mau
Alguns dos geradores de massacres são homensND
Logo, todos os homensD são maus
Este silogismo viola, ainda, a regra das proposições - a conclusão não segue a parte mais fraca - a premissa maior é A e a menor é I, a conclusão deveria ser I e é do tipo A. Há quem lhe chame falácia existencial.
|
Um comentário:
Professora, boa tarde.
Poderia me responder se esta foi a aula que a senhora deu para a turma do galileu noturno, no último sábado?
Muito obrigada.
Postar um comentário